O aumento real das vendas do varejo brasileiro em 2011, de 6,7%
(10,8% em 2010), revela que a política econômica
usou instrumentos que de fato permitiram atingir o objetivo de
desacelerar a demanda de consumo na economia. Aumento de juros,
corte de gastos e, especialmente, as medidas macroprudenciais
na área do crédito foram as ações
que levaram ao resultado. O fato a ser observado é que
a despeito de ter desacelerado seu crescimento no ano passado,
o comércio manteve evolução significativa,
denotando que o mercado consumidor brasileiro ainda é capaz
de preservar a condição que nos últimos anos
vem conquistando de constituir um dos poucos redutos dinâmicos
de vendas em todo o mundo.
É digno
de registro também que apesar disto, a indústria
doméstica pouco se aproveitou desse processo em função
de uma concorrência com o produto importado que se torna
cada vez mais desigual devido a condições internas
francamente adversas, como por exemplo, na área cambial
e tributária. A indústria ampliou sua produção
em apenas 0,3% em 2011 e a produção de bens de consumo
que deveria se beneficiar largamente da evolução
do poder de compra da população brasileira declinou
0,7%.
Retornando
ao varejo, além das medidas de política econômica,
outros fatores estiveram em cena, condicionando o desempenho de
vários de seus segmentos. Os ciclos do varejo passaram
a ter uma complexidade muito maior na economia brasileira devido
à evolução da renda e do crédito,
a mudanças nos padrões de gastos das famílias
e em decorrência de movimentos decisivos em setores de intensa
inovação tecnológica. É possível
distinguir três ciclos no comércio.
Pode ser considerado
um ciclo de renda a trajetória que se inicia já
em fins de 2004 do setor de Supermercados, produtos alimentícios
e bebidas. Tal ciclo tem fundamento, sobretudo, na redistribuição
da renda promovida pelos programas sociais e elevação
do salário mínimo. Sua evolução chegou
a 8,9% em 2010 e no ano de crise de 2009 seu crescimento até
então recorde de 8,3% constituiu um dos sustentáculos
para o bom desempenho do varejo nesse ano (5,9%) e serviu como
instrumento de ação anti-cíclica para a economia.
O dinamismo
do setor que em média no período 2005/2011 teve
aumento de vendas reais de 6,2% correspondeu à intensificação
e diversificação do consumo de bens de primeira
necessidade de milhões de novas famílias que o Brasil
iria acrescentar ao seu mercado interno. A desaceleração
ocorrida em 2011, quando as vendas do setor tiveram variação
de 4%, reflete um menor crescimento da massa de rendimentos da
população (dado o menor crescimento do PIB no segundo
semestre), mas correspondeu também a mudanças no
gasto desses novos consumidores, que transitam para itens como
bens duráveis e serviços. Destacadamente, foi a
desaceleração desse segmento em 2010 o fator que
conduziu ao menor ritmo de desempenho do varejo nacional. O forte
aumento do salário mínimo no corrente ano poderá
voltar a despertar o ciclo anterior de expansão.
Em termos
gerais e guardadas certas peculiaridades, enquadram-se também
no “ciclo de renda” outros segmentos, como Tecidos,
vestuário e calçados, Artigos farmacêuticos,
médicos, de perfumaria e cosméticos e Livros, jornais,
revistas e papelaria.
O ciclo de
duráveis teve também por base a evolução
da renda, mas seu extraordinário crescimento nos últimos
sete anos (exceção para 2009), teve como alavanca
a expansão do crédito para as pessoas físicas
promovida pela formalização da economia, pela inovação
financeira representada pela criação do crédito
consignado e por uma intensa concorrência bancária
que procurou atrair a nova clientela de consumidores e que para
tanto promoveu uma ampla oferta de crédito e expressiva
majoração dos prazos de pagamento.
As vendas
dos segmentos de Móveis e eletrodomésticos tiveram
crescimento superior a 10% em vários anos do último
ciclo de expansão da economia brasileira (média
de evolução de 13,3% entre 2005 e 2011). Nesse caso,
nem mesmo a política de contenção de crédito
desacelerou significativamente a expansão das vendas em
2011 que preservaram um crescimento de 16,6% (18,3% em 2010).
É possível que uma desaceleração mais
significativa seja a trajetória predominante nesse segmento
em 2012, a despeito dos incentivos que em fins do ano passado
o governo concedeu à chamada linha branca. Quanto ao outro
destacado segmento de duráveis, qual seja, Veículos,
mortos e auto-peças, também muito dinâmico
e que acusou aumento médio anual de 10,5% no mesmo período,
o ciclo já mostrou sinais de desaceleração
em 2011, ano em que o crescimento foi de 6,1% contra 14,1% em
2010.
Com características
próprias por contar com sistema dedicado de financiamento
e recentemente sendo beneficiado com um ousado programa de expansão
(o “Minha Casa, Minha Vida”), o varejo de Material
de construção pode ser incluído no ciclo
de duráveis, embora tenha iniciado mais tarde seu crescimento
(em 2007). A perspectiva para 2012 é de manutenção
do dinamismo desse segmento que cresceu 9,1% em 2001 e 4,8% na
média anual de 2005-2011.
Finalmente,
um longo ciclo de inovação vem dando a tônica
do segmento de maior expansão do varejo, qual seja, equipamentos
de escritório, informática e comunicação,
com variação real média de nada menos do
que 28,2% no período em foco. Dado o intenso processo inovador
que mantém em alta velocidade a diferenciação
de produtos e o barateamento dos bens, a expansão nesse
caso chegou a 19,6% em 2011, que pode ser considerada em linha
com o crescimento de 24,3% em 2010. A continuidade de tão
alto padrão de vendas dependerá da continuidade
das inovações no setor.
É possível
que a desaceleração do varejo registrada em 2011
tenha sequência em 2012, quando se espera que o quadro negativo
da economia mundial restrinja o crescimento econômico brasileiro.
Mas, os diversos ciclos do varejo relatados acima parecem indicar,
talvez com exceção do ciclo de duráveis,
que será mantido um bom ritmo de expansão das vendas.
Para a indústria, isso significa dizer que haverá
espaço de crescimento se as condições que
atualmente levam à falta de competitividade forem atenuadas.