17 de fevereiro de 2012

Comércio e Indústria
Os ciclos do varejo e a indústria


   

 
O aumento real das vendas do varejo brasileiro em 2011, de 6,7% (10,8% em 2010), revela que a política econômica usou instrumentos que de fato permitiram atingir o objetivo de desacelerar a demanda de consumo na economia. Aumento de juros, corte de gastos e, especialmente, as medidas macroprudenciais na área do crédito foram as ações que levaram ao resultado. O fato a ser observado é que a despeito de ter desacelerado seu crescimento no ano passado, o comércio manteve evolução significativa, denotando que o mercado consumidor brasileiro ainda é capaz de preservar a condição que nos últimos anos vem conquistando de constituir um dos poucos redutos dinâmicos de vendas em todo o mundo.

É digno de registro também que apesar disto, a indústria doméstica pouco se aproveitou desse processo em função de uma concorrência com o produto importado que se torna cada vez mais desigual devido a condições internas francamente adversas, como por exemplo, na área cambial e tributária. A indústria ampliou sua produção em apenas 0,3% em 2011 e a produção de bens de consumo que deveria se beneficiar largamente da evolução do poder de compra da população brasileira declinou 0,7%.

Retornando ao varejo, além das medidas de política econômica, outros fatores estiveram em cena, condicionando o desempenho de vários de seus segmentos. Os ciclos do varejo passaram a ter uma complexidade muito maior na economia brasileira devido à evolução da renda e do crédito, a mudanças nos padrões de gastos das famílias e em decorrência de movimentos decisivos em setores de intensa inovação tecnológica. É possível distinguir três ciclos no comércio.

Pode ser considerado um ciclo de renda a trajetória que se inicia já em fins de 2004 do setor de Supermercados, produtos alimentícios e bebidas. Tal ciclo tem fundamento, sobretudo, na redistribuição da renda promovida pelos programas sociais e elevação do salário mínimo. Sua evolução chegou a 8,9% em 2010 e no ano de crise de 2009 seu crescimento até então recorde de 8,3% constituiu um dos sustentáculos para o bom desempenho do varejo nesse ano (5,9%) e serviu como instrumento de ação anti-cíclica para a economia.

O dinamismo do setor que em média no período 2005/2011 teve aumento de vendas reais de 6,2% correspondeu à intensificação e diversificação do consumo de bens de primeira necessidade de milhões de novas famílias que o Brasil iria acrescentar ao seu mercado interno. A desaceleração ocorrida em 2011, quando as vendas do setor tiveram variação de 4%, reflete um menor crescimento da massa de rendimentos da população (dado o menor crescimento do PIB no segundo semestre), mas correspondeu também a mudanças no gasto desses novos consumidores, que transitam para itens como bens duráveis e serviços. Destacadamente, foi a desaceleração desse segmento em 2010 o fator que conduziu ao menor ritmo de desempenho do varejo nacional. O forte aumento do salário mínimo no corrente ano poderá voltar a despertar o ciclo anterior de expansão.

Em termos gerais e guardadas certas peculiaridades, enquadram-se também no “ciclo de renda” outros segmentos, como Tecidos, vestuário e calçados, Artigos farmacêuticos, médicos, de perfumaria e cosméticos e Livros, jornais, revistas e papelaria.

O ciclo de duráveis teve também por base a evolução da renda, mas seu extraordinário crescimento nos últimos sete anos (exceção para 2009), teve como alavanca a expansão do crédito para as pessoas físicas promovida pela formalização da economia, pela inovação financeira representada pela criação do crédito consignado e por uma intensa concorrência bancária que procurou atrair a nova clientela de consumidores e que para tanto promoveu uma ampla oferta de crédito e expressiva majoração dos prazos de pagamento.

As vendas dos segmentos de Móveis e eletrodomésticos tiveram crescimento superior a 10% em vários anos do último ciclo de expansão da economia brasileira (média de evolução de 13,3% entre 2005 e 2011). Nesse caso, nem mesmo a política de contenção de crédito desacelerou significativamente a expansão das vendas em 2011 que preservaram um crescimento de 16,6% (18,3% em 2010). É possível que uma desaceleração mais significativa seja a trajetória predominante nesse segmento em 2012, a despeito dos incentivos que em fins do ano passado o governo concedeu à chamada linha branca. Quanto ao outro destacado segmento de duráveis, qual seja, Veículos, mortos e auto-peças, também muito dinâmico e que acusou aumento médio anual de 10,5% no mesmo período, o ciclo já mostrou sinais de desaceleração em 2011, ano em que o crescimento foi de 6,1% contra 14,1% em 2010.

Com características próprias por contar com sistema dedicado de financiamento e recentemente sendo beneficiado com um ousado programa de expansão (o “Minha Casa, Minha Vida”), o varejo de Material de construção pode ser incluído no ciclo de duráveis, embora tenha iniciado mais tarde seu crescimento (em 2007). A perspectiva para 2012 é de manutenção do dinamismo desse segmento que cresceu 9,1% em 2001 e 4,8% na média anual de 2005-2011.

Finalmente, um longo ciclo de inovação vem dando a tônica do segmento de maior expansão do varejo, qual seja, equipamentos de escritório, informática e comunicação, com variação real média de nada menos do que 28,2% no período em foco. Dado o intenso processo inovador que mantém em alta velocidade a diferenciação de produtos e o barateamento dos bens, a expansão nesse caso chegou a 19,6% em 2011, que pode ser considerada em linha com o crescimento de 24,3% em 2010. A continuidade de tão alto padrão de vendas dependerá da continuidade das inovações no setor.

É possível que a desaceleração do varejo registrada em 2011 tenha sequência em 2012, quando se espera que o quadro negativo da economia mundial restrinja o crescimento econômico brasileiro. Mas, os diversos ciclos do varejo relatados acima parecem indicar, talvez com exceção do ciclo de duráveis, que será mantido um bom ritmo de expansão das vendas. Para a indústria, isso significa dizer que haverá espaço de crescimento se as condições que atualmente levam à falta de competitividade forem atenuadas.
 

 

 

 

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