Os Ciclos do Varejo
Julio Gomes de Almeida
– Professor da Unicamp e ex-secretário
de política econômica do Ministério da Fazenda
Brasil Econômico – 16/02/2012

O aumento real das vendas do varejo brasileiro em 2011, de 6,7%, revela que a política econômica usou instrumentos que de fato permitiram atingir o objetivo de desacelerar a demanda de consumo na economia. Vale observar que no ano anterior o varejo havia evoluído nada menos que 10,8%. Aumento de juros, corte de gastos e, especialmente, as medidas macroprudenciais na área do crédito foram as ações que levaram ao resultado. Mas, muitos outros fatores independentes da política econômica estiveram em cena, condicionando o desempenho dos vários segmentos do comércio. Os ciclos do varejo passaram a ter uma complexidade muito maior na economia brasileira devido à evolução da renda e do crédito, a mudanças nos padrões de gastos das famílias e em razão de movimentos decisivos em setores de intensa inovação tecnológica.

Podemos chamar de ciclo de renda ao crescimento do setor de supermercados, produtos alimentícios e bebidas que se inicia já em fins de 2004, como fruto da redistribuição da renda promovida pelos programas sociais e elevação do salário mínimo. Disto resultaram taxas expressivas que chegaram a 8,9% em 2010. No ano de crise de 2009, a marca de 8,3% constituiu um dos sustentáculos para o bom desempenho do varejo nesse ano (5,9%). O dinamismo do setor correspondeu à intensificação e diversificação do consumo de milhões de novas famílias que o Brasil iria acrescentar ao seu mercado interno. A desaceleração ocorrida em 2011, quando as vendas do setor tiveram variação de 4%, reflete mudanças no gasto desses novos consumidores, que transitam para itens como bens duráveis e serviços.O forte aumento do salário mínimo no corrente ano poderá voltar a despertar o ciclo anterior de expansão.

O ciclo de duráveis teve também por base a evolução da renda, mas seu extraordinário crescimento nos últimos sete anos (exceção para 2009), teve como alavanca a expansão do crédito para as pessoas físicas promovida pela inovação financeira representada pela criação do crédito consignado e por uma intensa concorrência bancária que procurava atrair a nova clientela de consumidores e que promoveu uma ampla oferta de crédito e expressiva majoração dos prazos de pagamento. As vendas dos segmentos de móveis e eletrodomésticos e de veículos tiveram crescimento superior a 10% em vários anos do último ciclo de expansão da economia brasileira. Nem mesmo a política de contenção de crédito desacelerou significativamente a expansão das vendas de móveis e eletrodomésticos, que preservaram um crescimento de 16,6% em 2011 (18,3% em 2010). Mas, no segmento de veículos o ciclo de duráveis está mostrando sinais de desaceleração: crescimento de 6,1% em 2011 contra 14,1% em 2010.

Finalmente, um longo ciclo de inovação vem dando a tônica do segmento de maior expansão do varejo, qual seja, equipamentos de escritório, informática e comunicação. Dado o intenso processo inovador que mantém em alta velocidade a diferenciação de produtos e o barateamento dos bens, a expansão nesse caso chegou a 19,6% em 2011, que pode ser considerada em linha com o crescimento de 24,3% em 2010.


Julio Gomes de Almeida é professor da Unicamp
e ex-secretário de política econômica do Ministério da Fazenda