Em 2011, o comércio exterior dos bens típicos da
indústria de transformação foi deficitário
em US$ 48,7 bilhões, um valor superior em 40,2% ao já
expressivo déficit de US$ 34,8 bilhões registrado
em 2010. Outro dado negativo: a participação dos
produtos industriais na pauta exportadora brasileira chegou a
57,8%, muito aquém dos 81,3% correspondentes ao ano 2000.
Responde por esse resultado um processo muito intenso de commoditização
da pauta exportadora brasileira, o qual ganharia forte impulso
após 2005 com o boom dos preços internacionais de
produtos primários impulsionado pelo crescimento econômico
chinês.
Outro movimento
vai se tornando evidente nos últimos dados do comércio
exterior brasileiro: dentro das próprias commodities tem
havido um aumento dos itens de menor valor agregado. De fato,
commodities do setor extrativo mineral e da agropecuária
vêm ganhando terreno vis-à-vis commodities industriais
delas derivadas, fato este associado ao peso dos impostos e demais
custos sistêmicos que incidem sobre o produto manufaturado
quando são ampliadas as etapas de produção.
A propósito, o superávit comercial de US$ 78,5 bilhões
que as mercadorias típicas da extração mineral
(saldo de US$ 43,3 bilhões), da agropecuária (US$
29 bilhões) e demais segmentos (US$ 6,2 bilhões)
obtiveram, mais do que compensou o déficit da indústria
de transformação, levando a um saldo global de US$
29,8 bilhões, um aumento de US$ 9,5 bilhões ante
o resultado do ano anterior.
Exportar commodities
é bom para o país porque ajuda a dar sustentabilidade
às contas externas, mas a excessiva dependência de
maiores preços para elevar as vendas ao exterior desses
produtos como ocorreu em 2011, é fator de vulnerabilidade.
No ano passado até novembro, segundo a Funcex, nossas exportações
de produtos básicos foram 39,3% maiores do que em 2010,
superando o crescimento de 29,2% das exportações
totais. No entanto, o aumento em volume foi de somente 4,3%, enquanto
os preços médios cresciam 33,7%.
O déficit
comercial da indústria também não é
em si ruim. Mas, o quadro muda diante de duas constatações.
Primeira, a velocidade com que o processo vem se desenvolvendo
é inusitada e reveladora das forças adversas que
estão em jogo. O resultado comercial da indústria,
cujo valor em 2011 foi negativo em quase US$ 50 bilhões,
era superavitário em US$ 18,8 bilhões em 2007. Em
segundo lugar, o enorme descompasso entre o dinamismo do mercado
consumidor doméstico e a produção industrial
interna, como aconteceu em boa parte de 2011, evidencia uma súbita
e enorme perda de competitividade da produção nacional
em relação ao produto importado. Assim, se as vendas
do varejo cresceram 6,9% em termos reais no período de
janeiro a novembro de 2011 frente a mesmo período 2010,
a evolução da produção de bens de
consumo industriais foi negativa em 0,7%. Há capacidade
ociosa na indústria mundial e a grande vantagem que um
país como a China obtém com seu controle sobre o
câmbio concorrem para a formação de agressivos
preços nas exportações para o Brasil, o que
desloca a produção de bens comercializáveis
realizada no país, especialmente os da indústria.
Em suma, a
taxa de câmbio continua como óbice às vendas
externas do Brasil, assim como os conhecidos problemas de infraestrutura,
complexo sistema tributário, custo de capital e de energia,
carência de recursos humanos qualificados e baixa produtividade
em serviços.
A ironia é
que a favor do Brasil está sua baixa exposição
a desastres naturais, diferentemente do que tem ocorrido recentemente,
a exemplo do Japão com o tsunami e da Tailândia,
cujas enchentes comprometeram a produção de discos
rígidos usados em computadores, notebooks etc. Tais fenômenos
têm levado as transnacionais a reverem suas estratégias
de cadeias produtivas enxutas. As corporações querem
mais opções para não ficar refém de
fornecedores e serviços. Logo, é um momento propício
para a inserção brasileira. A questão é
suplantar os obstáculos expostos acima e aproveitar a janela
de oportunidades, que pode não se abrir desta forma futuramente.
Com o cenário
internacional desfavorável por conta dos desdobramentos
da crise internacional, as poucas oportunidades que surgem para
os produtos produzidos no Brasil devem ser buscadas com afinco.
O fato da estratégia de cadeias enxutas estarem em xeque
é uma delas, o que casa com o intento do governo federal
em atrair fornecedores de componentes eletrônicos, um dos
focos do déficit comercial, bem como de buscar defender
e fomentar segmentos intensivos em recursos humanos, como a indústria
têxtil, do vestuário e calçadista. A adição
de valor também deve continuar a ser perseguida na perspectiva
de que elos produtivos podem ser difusores de um “aprender
a fazer” essencial para ganhos de produtividade na indústria.