18 de janeiro de 2012

Economia e Política Econômica
A questão do financiamento

de longo prazo e o BNDES


  

 
Algumas manifestações vêm propondo o imediato fim do crédito direcionado mantido pelo Brasil nas áreas do investimento, habitação e setor rural. Alternativamente, os financiamentos nessas áreas desde já deveriam passar, segundo essas teses, a ter a taxa Selic como referência, o que os encareceria sobremaneira. O argumento é que com ações dessa ordem a taxa básica de juros da economia poderia cair mais rapidamente.

O tema é muito relevante e seu debate deve considerar os diversos fatores que levaram à estruturação no país de um sistema especial de financiamento em paralelo ao crédito voluntário, este mais especializado em operações de curto prazo, enquanto o outro se atém majoritariamente a operações de mais longo prazo e de maior risco. Muitas economias dispõem de algum tipo de suporte financeiro público aos setores primário e habitacional e criaram, a exemplo da China, para citar apenas o caso do fenômeno industrial mais recente, sistemas oficiais de financiamento do desenvolvimento.

No Brasil, tem sido realmente notável a ascensão do BNDES no financiamento empresarial nos últimos anos. Mas, tal tendência é, antes, uma decorrência e não a causa das taxas de juros extraordinariamente elevadas em vigor por um prolongado período de tempo no país. Isso inibiu o progresso de linhas de crédito de longo prazo em nosso sistema financeiro e aprofundou o papel do nosso banco de desenvolvimento. Também deve ser destacado que o crédito dirigido vem cumprindo certos requisitos. Tomando uma vez mais o BNDES como ilustração, é reconhecida sua competência na análise de projetos e a inadimplência em suas operações é baixíssima. Por outro lado, a despeito de críticas à concentração de seus recursos em certos setores – o que poderá ser evitado com uma maior precisão na definição de prioridades da política industrial – o fato é que o banco sempre protagonizou as mais importantes mudanças da economia brasileira.

Assim, todo o cuidado será pouco para que não sejam desarticulados os atuais canais de financiamento que contribuem para a estabilidade e o desenvolvimento da economia. Caso as linhas de financiamento que hoje ajudam a amparar a habitação, o investimento, a inovação, o reequipamento na agricultura e na indústria, a exportação e a infraestrutura sejam descontinuadas ou seu custo seja subitamente majorado, os efeitos disso sobre a produtividade e o aumento da capacidade produtiva da economia poderão gerar efeitos contrários aos desejados.

O debate ganharia maior envergadura se viesse acompanhado da discussão sobre uma reforma do modelo de financiamento de longo prazo no país. Tudo ficará mais factível se a taxa básica de juros tiver um percurso sustentável de queda e, nesse sentido, é decisivo que o governo mantenha e aprofunde sua manifestada intenção de reunir forças no campo fiscal e creditício para auxiliar a política de juros no combate à inflação. Isto por si só beneficiará o financiamento voluntário de longo prazo. Mas será preciso ativar mecanismos para que, em paralelo, o financiamento do investimento na economia vá se libertando dos fundos públicos e da poupança forçada.

Desde o final de 2010 o governo vem instituindo incentivos para promover as linhas privadas de financiamento e no dia 1º de dezembro de 2011 reduziu de 6% para zero a alíquota do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) sobre as aplicações de não residentes em títulos privados de longo prazo. Mas, a nosso ver, seria também oportuna uma revisão das ações já adotadas para que mais amplos estímulos para as aplicações domésticas de longo prazo permitam alcançar o objetivo com maior brevidade.

Por exemplo, o governo concedeu incentivos muito amplos de isenção de IR para os aplicadores estrangeiros em títulos públicos e privados, mas restringiu sobremaneira o benefício para o nacional. Se houver um equilíbrio maior na regulamentação será aberto um caminho para que as reduções na taxa básica de juros tenham um maior e mais imediato impacto no desenvolvimento do mercado de capitais. O IEDI está estudando o tema e em breve divulgará suas sugestões a esse respeito.

O financiamento voluntário de longo prazo também será favorecido pela desindexação que o governo poderá promover na dívida pública, eliminando ou restringindo os títulos com remuneração associada à taxa Selic que tanto favorece as aplicações de curto prazo quanto desestimula a poupança de longo prazo. O resultado será um sistema onde os instrumentos de mercado, as linhas privadas e as fontes voluntárias de financiamento terão uma expressão maior mesmo entre as modalidades de financiamento hoje atendidas quase integralmente pelo crédito direcionado.

Na transição, as agências públicas, como o BNDES, terão papel fundamental. Deverão manter suas linhas de financiamento para não interromper o investimento, mas, gradativamente, poderão usar sua força indutora para acelerar a passagem ao novo modelo, exigindo ou incentivando maior participação do mercado de capitais no financiamento dos projetos apoiados e promovendo operações conjuntas com instituições privadas. Uma agenda como essa demandará muito empenho e complexa articulação público-privada, mas seu resultado pode ser recompensador por dotar o país de bases adequadas ao financiamento privado. O grande beneficiário será o desenvolvimento econômico e social do país.
 

 

 

 

 

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