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A crise desencadeada em 2008 encontrou o Brasil preparado para
uma resposta eficaz. Reunimos as condições daquela
época para reagir da mesma forma agora? Em 2008 e 2009,
as decisões de política econômica se concentraram
na restauração do crédito, através
da redução do compulsório, da compra de carteiras
e da ação dos bancos públicos, com destaque
para o BNDES, para aumento do crédito. Essas medidas foram
complementadas por várias outras ações, destacando-se
aquelas que baratearam através de redução
de impostos o crédito ao consumo e a compra de bens duráveis,
como automóveis, bens da linha branca e material de construção.
O governo também ampliou o investimento na infraestrutura
e deu prosseguimento aos programas de renda, além de criar
programas novos, como o Minha Casa Minha Vida.
O conjunto
dessas medidas não só impediu uma crise bancária
como deu sustentação ao financiamento corrente da
economia e impediu uma queda que seria de grandes proporções
no consumo familiar e no investimento, abrindo caminho para uma
rápida reativação do crescimento. É
preciso também observar que o ingresso de um grande número
de famílias no circuito emprego-renda-crédito-consumo
que vinha se formando e o desenvolvimento de um vigoroso ciclo
de investimento também serviram de base para a rápida
resposta da economia às medidas de estímulo fiscal
e creditício. Notar ainda que a política monetária
teve pouca relevância na resposta brasileira à crise.
Por isso,
a crise internacional que se abateu sobre o Brasil foi transformada
em uma mera interrupção transitória de um
ciclo de crescimento cujas forças de expansão não
haviam se esgotado.
Hoje a economia
brasileira vive outra situação. Desde o segundo
trimestre de 2011, os gastos de consumo e de investimento sofrem
uma desaceleração. No consumo, isso responde ao
arrefecimento típico da demanda de bens duráveis
após um crescimento exponencial e às medidas de
aumento de juros e de restrição ao crédito
que buscaram evitar a formação de uma bolha de consumo.
No que se refere ao investimento, a inversão pública
vem desacelerando e o investimento industrial declinou acentuadamente
devido às perspectivas de deslocamento da demanda para
as importações. Como convém sublinhar, o
presente quadro de desaceleração vem se configurando
independentemente do agravamento da crise internacional, ou seja,
decorre das circunstâncias internas da economia brasileira.
Caso sejam
confirmados a forte perda de ritmo da economia e o agravamento
da crise global, será exigida uma ação do
governo diferente da empreendida em 2008. Em primeiro lugar, a
política monetária deve responder com uma maior
redução da taxa Selic. Nesse sentido, a diminuição
da taxa básica iniciada em agosto e o prosseguimento do
processo definido ontem pelo Banco Central, que novamente reduziu
a taxa básica, para 11% ao ano, mostram que a política
econômica está atenta aos acontecimentos. Em segundo
lugar, deve-se se ter em conta que os instrumentos de reativação
do crédito ao consumo e ao investimento adotados anteriormente
poderão não ter a mesma eficácia em razão
do estágio do ciclo de consumo e de inversões da
economia.
No investimento,
o governo deveria procurar acelerar a inversão autônoma
em infraestrutura e reativar na medida do possível o programa
Minha Casa Minha Vida. No consumo já foram afrouxadas as
medidas do final do ano passado que contiveram o crédito
para as famílias e é esperado um impulso adicional
relevante no consumo de base devido ao aumento do salário
mínimo que ocorrerá no início de 2012, previsto
em 14%.
As medidas
de hoje complementam as ações para dinamizar o consumo
e de quebra reduzem os impostos sobre os investimentos estrangeiros,
procurando também incentivar as inversões privadas
e o financiamento de longo prazo da economia. Os impostos sobre
os produtos da linha branca foram reduzidos, assim como os impostos
sobre o crédito e maiores incentivos foram concedidos ao
Programa Minha Casa Minha Vida. Essas, assim como as medidas anteriores,
sugerem que o governo está particularmente preocupado com
os efeitos do agravamento da crise global e seus possíveis
impactos adversos no crescimento econômico doméstico
em 2012.
Uma observação
final, porém muito relevante, é que o governo deve
se cercar de cuidados para não permitir uma nova revalorização
do Real, caso essa tendência se apresente. Num ambiente
de extrema agressividade por mercados externos que caracteriza
o mundo atual, os possíveis efeitos das medidas que vem
sendo anunciadas podem se dissipar, o que acabará beneficiando
não a sustentação do crescimento e do emprego
em nossa própria economia, mas sim nas economias de outros
países. O tema merece também que todos os mecanismos
disponíveis de defesa comercial sejam mobilizados.
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Medidas. Segundo o Ministério da Fazenda, as medidas
de hoje consistiram em três decretos e uma MP.
Um dos decretos reduz
o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) em algumas modalidades.
A alíquota do tributo cai de 2% para zero sobre os investimentos
externos em ações - tanto oferta primária (IPO) quanto
no mercado secundário -, venture capital (capital de risco) e cancelamento
de recibos de ações de empresas brasileiras negociadas no
exterior. A medida incentiva a entrada de capital estrangeiro com perfil
de investimento de longo prazo. Também está sendo reduzida
de 6% para zero a alíquota do IOF cobrada sobre aplicações
de não-residentes em títulos privados de longo prazo com
duração (duration) acima de quatro anos, medida que também
estimula o investimento e o financiamento privado de longo prazo.
Sobre o crédito
para pessoa física, a taxa anual do IOF cai de 3% para 2,5% ao
ano (de 0,0082% ao dia para 0,0068% ao dia), iniciativa que estimula os
financiamentos internos.
Outro decreto reduz
a alíquota do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) incidente
sobre fogões, refrigeradores e congeladores, lavadoras de roupa
elétricas e tanquinhos, itens da chamada linha branca. A desoneração
vale para os produtos com índice de eficiência energética
Classe A e terá vigência até 31 de março de
2012. A medida estimula o consumo de bens duráveis.
Está sendo
reduzido, ainda, de 10% para 5% o IPI sobre esponja de lã de aço
e de 15% para zero o tributo sobre papel sintético (papel de plástico),
destinado à impressão de livros e periódicos, com
o objetivo de alinhar suas respectivas alíquotas àquelas
praticadas sobre produtos similares.
A Medida Provisória
que também está sendo publicada hoje estabelece a elevação
do valor para classificação de imóvel popular para
ingresso no Regime Especial de Tributação (RET) da Construção
Civil aplicável às incorporadoras imobiliárias com
projetos no âmbito do Programa Minha Casa Minha Vida. O valor passa
de R$ 75 mil para R$ 85 mil. A iniciativa ajusta o Programa às
condições de mercado atuais.
Na mesma MP, o governo
reduz de 9,25% para zero as alíquotas de PIS/Cofins sobre massas
até 30/06/2012 e prorroga até 31/12/2012 a desoneração
desses tributos sobre trigo, farinha de trigo e pão comum, medida
que contribui para reduzir a tributação indireta sobre alimentos.
O terceiro decreto
regulamenta o Programa Reintegra, que prevê a devolução
de impostos no montante equivalente a até 3% das receitas de empresas
exportadoras de bens industrializados.
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