30 de setembro de 2011

Indústria
Uma visão da contribuição e das
lacunas da nova política industrial


  

 
O Plano Brasil Maior (PBM) tem o mérito de adotar medidas de redução do custo tributário da indústria em um momento de dificuldades do setor. Traz ainda contribuições pioneiras, como a desoneração da folha e a instituição de um ressarcimento de até 3% das exportações por tributos não recuperados pelos exportadores. Além disso, completou a remoção de tributos federais sobre o investimento. Ficou de fora a retirada dos indevidos incentivos fiscais que certos estados dão às importações.

Não devemos perder de vista que, mesmo com as novas medidas, o Brasil ainda não facilita o investimento, a inovação e a exportação como fazem outros países. A nosso ver, uma política industrial pode prever incentivos mais amplos, desde que reservados para premiar os esforços de investir e inovar não só da indústria, mas de todos os setores da economia, e para promover o florescimento das atividades industriais que nos conduzirão ao futuro. Áreas de sustentabilidade e de novas tecnologias estão entre as atividades para as quais o incentivo fiscal pode ser fundamental.

Talvez o maior mérito do PBM seja o reconhecimento de que a indústria é um vetor fundamental do desenvolvimento e que a política industrial é uma construção permanente, como salientou a Presidenta Dilma Roussef. Nesse sentido, três lacunas do Plano são extremamente graves e precisariam ser rapidamente sanadas sob pena de reduzir em muito o impacto das medidas.

Primeiramente, o PBM confere um horizonte muito curto, defensivo e limitado à política industrial brasileira. Em se tratando da indústria em um país como o Brasil, onde o peso desse setor na economia e sua diversificação são relevantes, os objetivos de longo prazo devem ser ousados. Desafio é a visão de futuro que se quer e é possível alcançar para a indústria. A política industrial serve de “ponte” entre o presente e essa antecipação do futuro. A ela cabe articular os mecanismos e dedicar energias, instrumentos, incentivos e recursos para que o objetivo seja confirmado. Nesse sentido, o PBM é pobre, mas pode evoluir muito como fruto de debates sobre, especialmente, sua maior lacuna, que é a ausência de uma visão de futuro da indústria.

Desafios compatíveis com o momento não faltam. Seria muito relevante a definição de setores, cadeias ou atividades dentro da preocupação de desenvolver desde já as bases da transformação industrial que sustentará o dinamismo de longo prazo da indústria. Economia do petróleo, manufatura de base agroalimentar, produção de bens, serviços e equipamentos referenciados à sustentabilidade, à nanotecnologia, à saúde e educação, além de outros temas que o debate com a sociedade venham a identificar, poderiam ser alvo de desafios mais ambiciosos e para eles deveriam ser direcionados os incentivos.

Um segundo ponto diz respeito à governança da política industrial, que avançou com o PBM, mas é ainda deficiente. Prestigiar o Conselho Nacional de Desenvolvimento Industrial como instância superior de aconselhamento à política é o ponto forte introduzido no PBM. No entanto, é necessário zelar para que este Conselho não se transforme em um fórum de debates de temas meramente setoriais e de alcance delimitado e de curto prazo. Sua pauta principal deve ser a definição dos rumos da indústria brasileira para que sua contribuição ao desenvolvimento do país seja maior.

Finalmente, a questão da produtividade. Para o Plano Brasil Maior o foco da nova política industrial está no estímulo à inovação para alavancar a competitividade da indústria. O Plano acerta em alçar a inovação a uma condição tão elevada. Mas, mesmo no caso de países líderes industriais, as empresas não são permanentemente inovadores, o que significa dizer que a indústria depende de outros fatores na definição de sua capacidade de competir com o produto produzido no exterior. Para conquistar maior competitividade, as economias que mais se destacam têm, além de grande atividade inovadora, primorosa produtividade e “competitividade sistêmica” de primeira linha. Reside aí uma lacuna no PBM. Não há no Plano uma única palavra sobre produtividade.

Desde que estabeleçamos corretamente o perfil e a estrutura da indústria que se deseja para o Brasil, melhoremos a governança do PBM e concedamos prioridade ao avanço da produtividade industrial, a indústria brasileira responderá à altura os desafios que a necessidade de um maior desenvolvimento econômico e social coloca para todos os setores econômicos do país.
 

 
O IEDI está divulgando em sua Carta uma análise do Plano Brasil Maior (PBM). Este tem o mérito de propor medidas de redução do custo tributário da indústria em um momento de dificuldades para o setor, que na média dos últimos três anos praticamente não evoluiu. Custos muito elevados são causas desse processo, aprofundadas por uma valorização muito pronunciada da moeda brasileira. Também concorreram para o colapso da competitividade industrial a baixa capacidade inovadora das empresas brasileiras e uma produtividade que deixa a desejar. A estagnação industrial é ainda decorrência do contexto internacional herdado da grande crise de 2008. Nele, as economias de base industrial passaram a disputar muito mais acirradamente os poucos mercados dinâmicos ainda existentes, o que determinou uma grande pressão competitiva ao produto brasileiro, seja em mercados externos e, crescentemente, também no mercado nacional.

As medidas do Plano são pertinentes de uma forma geral e aportam contribuições pioneiras. Uma delas é o “plano piloto” da desoneração da folha que pode ter impactos positivos para os setores industriais intensivos em mão-de-obra. Pioneira é também a instituição de um percentual de até 3% das exportações de ressarcimento aos exportadores por tributos que não são recuperados quando da venda de produtos para o exterior. Além disso, com o PBM, o governo completou a remoção de tributos federais sobre o investimento. Em suma, a retirada ou a suavização de custos tributários do emprego, do investimento e das exportações corresponde a um esforço importante do governo e constitui um avanço indubitável, muito embora a iniciativa tenha ainda alcance parcial porque ficam de fora os tributos que os estados cobram sobre o investimento e as exportações. Também ficou de fora do PBM a retirada dos indevidos incentivos fiscais que certos estados dão às importações.

Deve ser sublinhado que, mesmo com as medidas do PBM, o Brasil fica ainda muito longe de ser um país que facilita e incentiva o investimento, a inovação e a exportação. O que de fato se fez no PBM – e o que foi feito não é pouco – se insere no conceito de “remoção de desincentivos”, não configurando propriamente a concessão de incentivos. A nosso ver, uma política industrial pode prever a concessão de incentivos de fato (e não meramente remoção de desincentivos), desde que reservados para premiar os esforços de investir e inovar da economia como um todo (e não somente do setor industrial), assim como para promover o florescimento das atividades industriais que nos conduzirão ao futuro. Áreas de sustentabilidade e de novas tecnologias estão entre as atividades para as quais o incentivo fiscal pode ser fundamental.

Um importante avanço promovido no PBM reside nos Pontos fortes do PBM nos programas de financiamento à inovação e ao investimento. O comentário geral é que as medidas no caso do financiamento ao investimento pelo BNDES não parecem elevar significativamente o volume de recursos dessa instituição para o financiamento da indústria e serviços. A tônica foi outra: o estabelecimento de focos específicos para o direcionamento do financiamento incentivado. No caso das atividades priorizadas, foram determinadas as datas para o término do benefício, como é recomendável. Assim, o PSI (Programa de Sustentação do Investimento) que já tinha focos em bens de capital, inovação, exportação e Pro-Caminhoneiro, passa a incluir componentes e serviços técnicos especializados, equipamentos para a área de tecnologia de informação e telecomunicações, ônibus híbridos, Proengenharia e Linha Inovação Produção. O PSI vai até dezembro de 2012. Já o Revitaliza (programa anterior que beneficiava setores afetados pela concorrência externa como têxtil e confecção, couro e calçados, bens de capital e agora também autopeças) vai até a mesma data. Os demais programas incentivados são focados nas micros, pequenas e médias empresas, no ensino técnico e profissionalizante e em sustentabilidade.

Portanto, nesse campo, o PBM agiu inteiramente dentro da boa técnica de política de desenvolvimento: definiu os segmentos para os quais se dirige o incentivo do financiamento ao investimento com recursos do Tesouro Nacional e fixou a data para o término do incentivo.

Já no caso do financiamento à inovação, há expressivo aporte adicional de recursos para o financiamento e investimento em inovação, com os recursos novos repassados pelo BNDES à Finep no valor de R$ 2 bilhões que se somam a montante equivalente anteriormente aportado na Finep. O BNDES também criou programas relevantes nessa área, com destaque para o programa de financiamento dos planos globais de inovação das empresas, o que muda o foco do apoio financeiro à inovação. Este passa da ótica de um determinado projeto de inovação empresarial para o plano global de inovação da empresa. Quanto maior o horizonte financiável do plano empresarial, maior o alcance da medida.

Talvez o maior mérito do PBM seja o reconhecimento de que a indústria é um vetor fundamental do desenvolvimento brasileiro e que a política industrial deve ser concebida como um processo. Aperfeiçoamentos e adaptações do PBM são bem vindos e fazem parte dessa construção, como salientou a Presidenta Dilma Roussef quando do anúncio do Plano. Nesse sentido cabe apontar três lacunas extremamente graves do Plano que precisam ser rapidamente sanadas sob pena de reduzir em muito o impacto das medidas. Elas nos remetem a temas como a visão de futuro da indústria brasileira, a gestão do PBM e a questão da produtividade, cujo avanço deveria ser perseguido com a mesma determinação com que o governo e a iniciativa privada estão se empenhando para promover a inovação no país.

O PBM confere um horizonte muito curto, defensivo e limitado à política industrial brasileira. Em se tratando da indústria em um país como o Brasil, onde o peso desse setor na economia e sua diversificação são relevantes, os objetivos de longo prazo devem ser ousados. Desafio é a visão de futuro que se quer e que é possível alcançar para a indústria. O papel da política industrial é servir de “ponte” entre o presente e essa antecipação do futuro. A ela cabe articular os mecanismos e dedicar energias, instrumentos, incentivos e recursos para que a visão do amanhã seja confirmada. Nesse sentido, o PBM é pobre, mas pode evoluir muito na sua sequência como fruto de debates sobre os desdobramentos do Plano e, especialmente, sobre a sua maior lacuna, que é a ausência ou quase isso de uma visão de futuro.

Desafios compatíveis para o momento e para o porte do parque industrial brasileiro não faltam. Seria muito relevante a definição de uma seleção de setores, cadeias ou atividades dentro da preocupação de desenvolver desde já as bases da transformação industrial que sustentará o dinamismo da indústria brasileira a longo prazo. Economia do petróleo, manufatura de base agroalimentar, indústria de bens, serviços e equipamentos referenciados à sustentabilidade, à nanotecnologia, à habitação, à saúde, além de outros temas que o debate com a sociedade venham a identificar, poderiam ser alvo de desafios mais ambiciosos e para eles poderiam ser direcionados os incentivos das políticas. O receio é que os incentivos e os instrumentos mobilizados pelo Plano se percam diante da não-definição de diretrizes para guiar sua destinação em prol da transformação da indústria.

Em suma, é claro que uma política industrial pode e deve contemplar diversos objetivos, como a preservação ou reforço da competitividade de setores, medidas para baratear e promover o investimento e as exportações, dentre outras, mas, sem o desafio da transformação da estrutura industrial, ela perde muito de seu significado e isso falta à nova política industrial.

A governança da política industrial nos parece ter avançado com o PBM, mas é ainda deficiente. Voltar a conceder prestígio ao CNDI no aconselhamento à política é o ponto forte introduzido no PBM no seu sistema de gestão. Cabem, no entanto, duas observações críticas a esse respeito. Primeiramente, é necessário zelar para que o CNDI não se transforme em uma instância de debates de temas meramente setoriais e de alcance delimitado e de curto prazo. A este Conselho deveria ser atribuída a pauta principal de debater o futuro da indústria e procurar identificar soluções para que o setor venha a contribuir o máximo possível com o desenvolvimento do país.

Em segundo lugar, o sistema de gestão não estabelece uma clara e indiscutível agência governamental responsável em última instância pelo plano. A referência, nesse caso, é o PAC que teve na Casa Civil essa agência catalisadora, um dos fatores responsáveis por permitir avanços naquele programa. A preocupação quanto à necessidade de definição de instância responsável deve-se à complexidade implícita na política industrial, a qual envolve muitos setores de governo e ações de diversas procedências que devem ser integradas de forma harmônica. Do contrário, o Plano pode ter resultados muito aquém do esperado devido à falta de coordenação e comando.

Finalmente, a questão da produtividade. Para o Plano Brasil Maior o foco da nova política industrial está no estímulo à inovação para alavancar a competitividade da indústria. O Plano acerta em alçar a uma condição tão elevada a questão da inovação e também são corretas as medidas adotadas para o reforço da inovação, a exemplo de programa instituído pelo BNDES para financiar o conjunto de atividades inovadoras das empresas, o que aproxima muito mais a política industrial brasileira da visão mais ampla de inovação.

Mas, mesmo no caso de países líderes industriais, as empresas e os setores não são permanentemente inovadores, o que significa dizer que a indústria de um país depende de outros fatores na definição de sua capacidade de competir com o produto produzido no exterior. Para conquistar maior competitividade, as economias que mais se destacam têm, além de grande atividade inovadora, primorosa produtividade e não descuidam de uma “competitividade sistêmica” que, igualmente, deve ser de primeira linha.

Reside aí uma lacuna no PBM. Não há no Plano uma única palavra sobre produtividade, muito embora para esse tema deveriam ser endereçados programas, incentivos e metas específicos, tal a sua relevância. É claro que por escapar à sua alçada, o Plano Brasil Maior não poderia abordar as questões da competitividade sistêmica, mas não vamos esquecer que delas decorre um efeito devastador sobre a competitividade do produto nacional. O mesmo vale para o câmbio. A intensidade da valorização da moeda nos últimos anos sobrepujou largamente quaisquer ganhos obtidos com a inovação e com o aumento da produtividade industrial.

Para o Brasil competir mais e melhor, inovar é imprescindível, mas sem maior produtividade e políticas e reformas que dêem suporte ao setor produtivo nos campos cambial, tributário, da infraestrutura e do financiamento de longo prazo qualquer política industrial não será suficiente para mudar de direção o processo que está levando a uma crescente perda da posição do produto industrial brasileiro no exterior e também no mercado interno.

Desde que estabeleçamos corretamente o perfil e a estrutura da indústria que se deseja para o Brasil, melhoremos a governança do PBM e concedamos prioridade à produtividade ao lado da inovação industrial, a indústria brasileira responderá à altura os desafios que a necessidade de um maior desenvolvimento econômico e social coloca para todos os setores econômicos do país.

 

 

 

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