A produção da indústria brasileira, como
divulgou o IBGE, teve novo revés em junho: caiu 1,6% na
comparação com maio na série com ajuste sazonal
e, com relação a junho do ano passado, o aumento
foi de somente 0,9%. No primeiro semestre evoluiu 1,7% com relação
ao mesmo período de 2010, numa clara demonstração
de que o crescimento em 2011 será fraco, inferior a 3%.
A indústria não vive um bom momento, pois não
consegue acompanhar o dinamismo do mercado consumidor do País,
em razão de uma crescente incapacidade do setor industrial
em fazer frente à produção do exterior, seja
em mercados externos, seja, cada vez mais, no próprio mercado
interno.
Isso vem gerando
uma situação aparentemente paradoxal, na qual a
economia cresce e gera capacidade de compra para sua população,
mas a produção capaz de agregar valor – vale
dizer a produção da indústria – não
acompanha. É fato que a produtividade da indústria
brasileira poderia ter uma evolução maior e sua
atividade inovadora apresenta deficiências, mas sua condição
de seguir um mundo em que é muito maior a competição
entre os produtores industriais se vê seriamente limitada,
sobretudo por uma moeda hiper-valorizada, como é o real,
e por custos sistêmicos (tributos, custo de capital, custos
de infraestrutura, etc) muito altos. A política industrial
anunciada na semana passada procurou amenizar esse quadro adotando
medidas de redução tributária e, nesse sentido,
foi positiva.
Pois bem,
o que mostra uma classificação dos setores industriais
que o IEDI adota é que o segmento de alta tecnologia está
resistindo mais à má fase que atinge a indústria
brasileira. Em verdade, o crescimento no primeiro semestre de
2011 por intensidade tecnológica mostra uma "escada"
descendente de desempenhos, da alta para a baixa intensidade tecnológica.
Assim, os segmentos de mais alta intensidade tiveram aumento de
produção de 6,6% no semestre, os segmentos de média-alta
tecnologia cresceram 2,5%, os de média-baixa tecnologia,
2,3%, e foi de –1,6% a evolução em baixa tecnologia,
sempre lembrando que a produção da indústria
de transformação nesse mesmo período cresceu
1,6% e a indústria geral, 1,7%.
Certas características
do momento econômico brasileiro explicam essa diversidade
de performance. Há uma diferença com relação
ao impacto da grande crise de 2008, que por causar um colapso
na confiança e no crédito afetou de forma imediata
e drástica os setores de maior intensidade tecnológica,
os quais têm em geral valores unitários maiores,
e poupou relativamente os setores de mais baixa tecnologia. Na
atual conjuntura não se trata de uma crise, mas, sim, de
uma desaceleração da economia, em particular da
indústria, que vinha de patamar de crescimento muito alto,
da ordem de 10,5%, em 2010.
Uma primeira
causa dessa desaceleração tem dimensão interna
e não é atinente apenas à indústria.
Trata-se da promoção, pelo governo, de um esfriamento
da economia para combater a inflação. O PIB brasileiro
deve estar crescendo atualmente na casa de 4% ao ano, quase a
metade do que cresceu em 2010 (7,5%). Isso é resultado
de uma evolução menor do emprego, do rendimento
médio da população e do crédito, reflexo
de medidas de contenção do gasto público,
de controle do crédito e de aumento da taxa básica
de juros.
O segundo
fator é a concorrência muito intensa de importados,
que estão substituindo a produção doméstica
em vários setores. O impacto desse segundo fator é
expressivo, mas, como em alta tecnologia e em média-alta
tecnologia o dinamismo do mercado interno é muito alto,
foi possível compensar em parte o grande aumento dos importados,
sem que nesses segmentos o crescimento da produção
fosse muito rebaixado. O quadro é diferente no extremo
oposto, ou seja, em baixa tecnologia, um segmento em que, na crise,
devido às políticas executadas pelo governo, houve
um crescimento expressivo. De fato as políticas de preservação
de renda e do emprego sustentaram um crescimento muito intenso
nas vendas e na produção de alimentos industrializados
durante a crise, o que agora reduz o ímpeto de sua expansão.
No segmento
de baixa tecnologia cabe ainda mencionar os resultados ruins em
setores em que a recém anunciada política industrial
promoveu reduções dos encargos trabalhistas, caso
dos setores têxtil/vestuário, calçados e madeira,
todos eles muito afetados em sua produção pela penetração
de bens importados. Em média-baixa tecnologia, um de seus
setores (minerais não-metálicos) foi o líder
de sua expansão, puxado pelo boom da construção
civil; não fosse isso, teria tido uma expansão diminuta.
Em média-alta tecnologia, são destaques os ramos
de veículos, com grande crescimento, devido ao dinamismo
do mercado interno, mas também os setores de máquinas
e equipamentos e produtos químicos, com baixo crescimento,
devido à concorrência das importações.
Por fim, em
alta tecnologia, o dinamismo do mercado interno também
acomodou o crescimento das importações. Esse segmento
valeu-se ainda de uma grande evolução da produção
de aviões, um setor que deixou para trás os efeitos
da crise, que nesse caso haviam sido muito graves e prolongados;
notar, no entanto, que um ramo deste segmento – material
de escritório e informática – teve variação
negativa, fruto das importações. Por outro lado,
o segmento de maior intensidade tecnológica talvez tenha
sido o que mais se beneficiou dos preços baixos dos componentes
importados, devido à valorização do real,
o que, por baratear custos de produção, aumentou
sua competitividade, preservando a participação
no mercado interno.
A substituição
de bens intermediários produzidos localmente por componentes
trazidos de fora não reduz o volume de produção,
mas deprime a agregação de valor do que é
produzido internamente. Isto pode promover a desindustrialização
de uma forma tão ou mais intensa do que a perda de mercados
para a importação de produtos finais, um tema que
a política industrial procurou abordar, mas de forma que
nos pareceu tímida, exceto no que tange ao setor automobilístico.
De qualquer forma, os segmentos de maior tecnologia aparecem como
os mais resistentes à concorrência em terceiros mercados
e às disputas no mercado doméstico, sendo relativamente
menos afetados em sua competitividade pelo fator taxa de câmbio.
O melhor desempenho em alta tecnologia ilustra como é relevante
dispor de uma estrutura diversificada como ainda é a indústria
brasileira.