1º de agosto de 2011

Indústria
A presença dos importados
no setor automotivo brasileiro


  

 
O mercado consumidor doméstico de veículos e autopeças teve excepcional crescimento no período 2005-2010. Em 2005, o total de veículos licenciados no Brasil foi de 1,7 milhão, chegando a 3,5 milhões em 2010. Isto é, a demanda interna aumentou em 1,8 milhões de veículos anuais, mais do que dobrando desde o início do período considerado. As razões para esse desempenho são várias. Mas, dois vetores, em especial, ajudam a explicar grande parcela desse novo patamar. São eles: o aumento real da massa de rendimentos e o crescimento do crédito, sobretudo para a aquisição de bens duráveis, como os automóveis. Como cabe notar, o mercado externo teve fraca performance para o produto brasileiro, com o encolhimento de 30% das exportações no mesmo período, em grande medida, devido à grande crise internacional de 2008.

Para atender a esse novo e dinâmico mercado interno, a oferta foi ampliada. Sempre com base os anos de 2005 e 2010, de um lado a produção nacional aumentou 75% e, de outro, as importações (em número de veículos importados licenciados) tiveram alta de 650%, saindo de 88 mil para 660 mil veículos. Com isso, a participação dos importados no licenciamento total, que era de apenas 5%, passou a ser de quase 19%, com tendência de alta, pois no primeiro semestre de 2011 essa parcela já alcançou 22,4%.

É ilustrativo avaliar o quanto o veículo importado vem absorvendo o crescimento do mercado interno consumidor ao longo do período. Na média dos cinco anos do boom do mercado automobilístico brasileiro – 2006 a 2010 -, quando o consumo interno anual de veículos cresceu em 1,8 milhões unidades, 31,8% desse aumento foi satisfeito pelo produto importado. Trata-se de um índice alto, mas sua evolução nos anos do pós-crise é muito mais impressionante. Em 2006 e em 2007, a importação respondeu por um quarto do crescimento do mercado interno, avançando para 28,1% no ano seguinte. Vale observar que o complemento desses percentuais corresponde à absorção pelo produto produzido no país, ou seja, cerca de 75% em 2006 e 2007 e 72% em 2008.

Já, no ano de 2009, o atendimento pelo produto estrangeiro do crescimento do mercado interno chegou a 35,4% e a 45,8% em 2010, com redução correspondente no atendimento da demanda interna pelo produto nacional para 65% e 54%, respectivamente, nesses dois anos. Isso significa que, na margem, o peso do produto importado em 2010 já praticamente equivalia ao da produção doméstica no mercado automobilístico nacional. Esses números indicam com clareza o quanto o quadro de produção interno versus importação está sendo alterado no período recente. Ademais, o futuro indica que a tendência é a de uma ainda maior penetração do produto automobilístico estrangeiro, pois no comparativo dos seis primeiros meses de 2011, o importado absorveu nada menos do que 68% do crescimento do mercado brasileiro, correspondendo a apenas 32% a absorção pelo veículo nacional.

A importação traz benefícios relevantes ao consumidor porque diversifica as opções de consumo, atua como incentivo para a redução de preços e para a melhora da qualidade do produto doméstico e é fator de atração de futuros investimentos de novos fabricantes. O lado negativo reside na velocidade do processo em que o produto do exterior vai sobrepujando o nacional, o que é reflexo não apenas de um contexto internacional em que o mercado brasileiro desponta como um dos mais dinâmicos em todo o mundo – e por isso é alvo de estratégias agressivas por parte de empresas internacionais –, mas que espelha também um déficit crescente de competitividade da produção realizada no Brasil, o que precisa ser corrigido de forma urgente.

A maior penetração do veículo e da autopeça importado no mercado brasileiro também foi observada em outros estudos. A FIESP, por exemplo, identificou, por meio do coeficiente de importação (CI), que no primeiro trimestre de 2006 os veículos importados abasteciam 7,5% do mercado, mas que passaram a representar 18,4%, no mesmo período de 2011. A mesma dinâmica do CI se repete nas autopeças, embora menos acentuadamente, uma vez que saíram de 9,3% para 11,4%, em igual base de comparação.

Contrapartida disso, a balança comercial do setor aprofunda seu déficit anualmente. Em 2010, as importações de automóveis e comerciais leves superaram as exportações, segundo a ANFAVEA, em US$ 4,9 bilhões e no que se refere às autopeças, de acordo com a ABIPEÇAS/SINDIPEÇAS, o déficit foi de US$ 3,5 bilhões naquele mesmo ano. Um déficit conjunto superior a US$ 8 bilhões é o resultado.

Nesse processo, todos os fornecedores estrangeiros ganharam, o que para eles foi importante no contexto global em que o mercado automobilístico no pós-crise mundial não recuperou o seu anterior crescimento. As principais conquistas no mercado brasileiro, até o momento, foram contabilizadas pela Argentina e pela Ásia, sobretudo pela Coréia do Sul. A China vem tendo presença crescente, mas ainda desponta muito mais como potencial do que como realidade.

Reverter essa tendência e fazer com que o desempenho do mercado interno volte a favorecer o investimento, a produção e emprego doméstico desta que é uma das mais longas e dinâmicas cadeias de produção é importante como instrumento para que a economia, a indústria e os serviços cresçam mais no Brasil. Existem opções. Aprimorar os instrumentos de apoio à atividade inovativa é condição necessária para que a indústria automotiva brasileira possa concorrer globalmente e, ao mesmo tempo, não perca participação relativa no seu próprio mercado. Mas há que se considerar, além disso, as assimetrias competitivas resultantes do ambiente econômico do País (em áreas como câmbio, tributação e custo de capital), razão pela qual o estímulo à inovação tecnológica dever ser ainda maior no Brasil, quando comparado ao que fazem os concorrentes internacionais.

Para concluir, a indústria automobilística brasileira passa por um momento repleto de desafios, mas também com muitas oportunidades. De fato, o mercado local é crescente. Mas, o que está em jogo é quem irá abastecê-lo. Indubitavelmente, essa escolha passa também pela política industrial que vier – ou não – a ser adotada. Estimular a inovação no setor é um caminho que pode, de uma só vez, trazer mais competitividade tanto internamente como abrir mercados externos aos veículos e autopeças do País.
 

 

 

 

 

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