15 de julho de 2011

Economia e Política Econômica
A primarização das exportações brasileiras


   

 
O debate tem crescente interesse e diz respeito ao aumento que vem ocorrendo exportações de produtos primários e um retorno a um passado em que o Brasil ainda não tinha empreendido sua industrialização. Levantamento do IEDI mostra que a participação de bens industriais no total vem declinando com grande velocidade: caiu de 80% para 59% entre o primeiro semestre de 2005 e o mesmo período de 2011. Aos bens da agropecuária e da extrativa mineral equivalem atualmente 41%, contra 20% em 2005. Na indústria, nenhum segmento foi poupado, muito embora a queda proporcional tenha sido maior em alta intensidade tecnológica (de 7% para 3,5%) e média-alta (de 25% para 17%) e bem menos em baixa (de 29% para 23%) e média-baixa tecnologia (de 18% para 15%).

Seria inevitável alguma elevação na importância relativa dos bens primários devido a um efeito puramente de preços, já que as cotações internacionais de alimentos, matérias primas e petróleo subiram excepcionalmente devido ao efeito conjunto do forte crescimento da economia chinesa e de um importante avanço da financeirização das commodities. Da parte de bens industriais, o período recente não propiciou aumentos de preços em razão do excesso de capacidade que se abriu a nível global no período de crise e mesmo no pós crise. Por isso, as exportações brasileiras de manufaturados deveriam forçosamente ceder espaço para primários, o que seria revertido em outro momento do ciclo econômico ou financeiro com a mudança em sentido contrário dos preços relativos. Nesse caso, as exportações industriais serviriam de sustentação para as exportações globais do país, compensando em alguma medida a queda das vendas externas de produtos primários. Para que este pêndulo opere da melhor forma possível é necessário que o Brasil preserve uma relevante diversificação exportadora, resista à tentação de deixar-se levar para a especialização de sua economia em algumas commodities e desenvolva um programa de reindustrialização.

O ponto fundamental é que a “primarização” vem ocorrendo não somente pela supervalorização das commodities, mas por um colapso da capacidade brasileira de colocar sua produção industrial em mercados externos e mesmo no mercado interno. Isto é decorrência em parte de décadas de ausência de políticas industriais e tecnológicas dignas desse nome e corresponde ao descaso continuado com que as políticas da última década e meia conduziram os temas da infraestrutura, da reforma tributária, do custo de capital e dos encargos sobre a folha de salários. Mas corresponde ainda ao fator decisivo que é o câmbio. Para alguns economistas a valorização da nossa moeda é outra consequência do boom das commodities, o que não é verdadeiro. As melhores condições de comercialização dos bens primários permitem compensar apenas em uma dimensão parcial o déficit em produtos industriais, em serviços (por exemplo, viagens internacionais) e em rendas (especialmente, remessa de lucros). Se os produtos primários não exercessem esse papel, uma crise cambial aberta teria interrompido o presente ciclo de crescimento. Mas, o resultado não é um largo superávit em transações correntes, o que contribuiria para valorizar o Real, mas sim um carrega um déficit externo que gradativamente é fonte de preocupação.

No caso brasileiro, a fonte da grande valorização de sua moeda não reside nos fluxos de comércio, serviços e rendas. A taxa de câmbio não é um “preço” de simples determinação por corresponder, além das variáveis correntes, às expectativas (vale dizer, antecipações sobre o futuro) e aos fluxos de capitais, os quais têm na instabilidade a sua marca registrada. O Real se valoriza e a indústria assiste sua competitividade desabar não porque as commodities têm bons preços, mas porque uma taxa de juros interna fora do comum e um tímido controle dos fluxos de capitais confirmam as apostas de valorização em mercados futuros. Enquanto o país se negar a ter uma estratégia de desenvolvimento que maximize todo o seu potencial, seja na produção de bens primários, seja na transformação e em serviços de qualidade, e enquanto não reposicionar a taxa de câmbio, todo o bem que uma condição internacional sui generis para os produtos básicos poderia trazer para o crescimento econômico será tido indevidamente como um mal.

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